sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Renata Lobato

















Esperava. Era como se todos os dias tivesse a oportunidade de ter-lo. Mas só teria a seus cabelos. Se vestia deles, como se vestisse ao próprio poder que um dia ele lhe havia dado. Provocando-lhe a vagina, seus cabelos eram como um incomodo suave, daqueles que precisavam todas as mulheres que bebem poder. Estavam ali, reunidos, mais de vinte guerreiros mortos. Todos. Somente naquela peça que cobria o rosado membro. Vestiu-os. Um a um. O negro guerreiro massai. O cabelo tupi Guariní. Os restos ainda amarelos de Sláine. Ali estavam suas armas, seus troços, seus falos, seus pelos. Tomou um pouco de vinho, como se iniciasse a cerimônia. Vestiu o branco. E se pos a imaginar. Aqueles arabescos todos. As tranças e os enredados que havia criado. A mucama perfeita se sentava à mesa com todos os espíritos. Armou-se de desejo. Vestiu um pouco mais de fio que havia lhe sobrado da veste anterior. Com os curtos pelos dourados de Moisés, acariciou o seio. Desceu até o pubis.

Dali deixou derramar um pouco de si. Encolheu os olhos, em reverência. Escolheu a cama, deixando repousar um pouco do que lhe havia sobrado. Todos os karmas lhe cabiam nessa hora. Mas só sentiu a Zeus, tocando sua displicência. Agradeceu e fechou os poucos pelos que lhe restavam nas pálpebras. Dormiu. O sono que lhe podiam roubar os mais calvos espíritos.


Vestir o outro é uma forma de poder. Aqui estou eu, dentro dessa intimidade que um dia foi testemunha de um segredo, uma fresta do mais particular que se pode guardar de outro. Orgânico, meu corpo se fez outro, se fez parte e se apropriou do que não era meu. Eu era parte de um espírito que caminhava entre ar e pelo. Dizem que cabelo é proteína, mas algo ali me dizia sou mais que isso. Não era cor, era elevação. Era um jogo entre o que não era meu e o que eu apropriava. Histórias que eu não pude contar me serviam para uma nova narrativa. Sim, eu tinha a varinha, o tear e a nova descrição. Era eu e era o outro que me servia. Uma forma de poder incômoda e deliciosa, especialmente porque me lembrava de quando não sou.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Mostra Coletiva Olheiro da Arte



vista meus cabelos, 2009
10 ampliações fotográficas 30x40cm

Entrevista na rádio UFMG sobre a Mostra Coletiva Olheiro da Arte, 01 de Março de 2010: